Márcio Ferraz: Motobruk e décadas de Harley Davidson
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Márcio Ferraz: Motobruk e décadas de Harley Davidson

Mecânico de motocicletas há quase três décadas, Márcio Ferraz, o Marcinho da Motobruk, já «hidrata» suas mãos com a graxa e óleo de Harley Davidson há 22 anos.


Quando deixou sua oficina multimarcas e ingressou no Grupo Izzo, então detentor da marca HD no Brasil, foi para uma das mais charmosas revendas Harley da capital paulista, só os «das antigas» conheceram a HD da Santa Justina.


Depois elencou a equipe de mecânicos de algumas lojas pioneiras junto a respeitados mecânicos veteranos, verdadeiras lendas; posteriormente lançou sua carreira solo à frente da Motobruk, onde trabalha sozinho, dedicando todo o seu tempo e conhecimento às motocicletas de seus clientes que fatalmente se tornam amigos.


Como todo bom morador ou comerciante do «Principado da Moóca», o melhor bairro do mundo; Marcinho é um boa prosa e carinhosamente nos cedeu horas de conversa, redigidas nas próximas linhas deste nosso tabloide eletrônico


Márcio: Eu tinha uma oficina multimarcas, mas comecei a trabalhar na Harley em 1998. Depois, fui trabalhar com Harley no Rafael da Chrome Eagle, na Avenida Dr. Cardoso de Mello. Lá eu conheci o Gustavo e o pessoal de Taubaté, mais ou menos 2000 ou 2001. De lá fui para a oficina do Sr. Doemes, na Rua João Cachoeira, oficina e loja Guard Rail. Ali ficava o Sr. Doemes, o Celsinho Siqueira, o Doeminho… Dali fui pra a Clodomiro Amazonas, na Blend Motos, com o Alex, Celsinho e Tomaselli... Ali perto tinha a sede dos Balaios na Santa Justina, depois a sede saiu e veio parar na Moóca, desde aquela época que os conheço. Depois, abri minha oficina própria na Rua Ribeirão Claro, a MotoBruk, rua que cruza a Cardoso de Mello, passa na Quatá. Ali fiquei dois anos e meio, e conheci o Franco Busti dos Balaios…


Luiz Gustavo Cabett (LGC): Lá o Marcinho arrumou minha Gunmetal


Márcio: De lá fui pra rua Alvorada, paralela à Bandeirantes e depois, me mudei para Moóca, de volta a minha antiga oficina. Vim pra cá em 2010 e estou aqui até hoje. Era minha antiga oficina multimarcas, mas de 1998 pra cá só mexo em Harley.

Antigamente, eu trabalhava com multimarcas porque o que aparecia aqui era Shovelhead, que era o que tinha. Era trazida pela Motovi e era vendida pelo Mappin, ou Mesbla, sei lá. Aparecia uma ou outra Panhead... uma «lateral» (Flathead), muito raramente. Mas, o que tinha era mais Shovel e uma ou outra Panhead, era só isso que tinha de Harley pra mexer.


Aí, quando a Shopscar pegou a concessão e foi lá pra Minas Gerais, começaram a vir mais Harleys, só que eles não tiveram capital pra bancar a demanda e a Harley não saía daquilo, ficou a conta-gotas, então, o Izzo foi lá, comprou a bandeira da Shopscar em Minas, trouxe um mecânico… o Lobo era da Shopscar. Trouxe o Lobo, o Nielsen... para São Paulo. Daí que deu esse boom.

Eu falo pra todo mundo: — Se os caras estão andando de Harley Davidson aqui no Brasil agradeçam ao Paulo Izzo. Ele deu uma parcela de ajuda pra fazer o que a Harley é hoje aqui.



LGC: vc acha que foi em 2007, quando ele quis produzir aqui que começou a mudança?


Márcio: Ali era o boom daquele cara estourar no Brasil. Mas, depois, o Izzo passou essa parte de montagem… eles que fizeram a linha… eles que começaram o início da montagem no Amazonas. Hoje a Harley é totalmente montada ali. Todas as motos, o motor vem inteiro desmontado.

Zé Caetano (ZC): Inclusive, se não estou enganado, agora, depois que Europa sobretachou as Harleys americanas, as Harleys da Europa saem do Brasil.

Márcio: O erro maior do Izzo não foi essa parte, mas ele trouxe Ducati, trouxe Aprilia, Trouxe Husqvarna… Aqui, fora os EUA, era o revendedor que mais vendia Harley no Mundo.

LGC: Marcinho, da sua época, eu lembro muito do Lobo, do Tadeu, que ainda está com a Harley em Santos… outro cara que era bom também era o Alemão, que trabalhava no Chachá…


Márcio: Marcelo Peixoto, que era o mais fera…

LGC: Marcelo fez a customização de uma moto de um dos filhos do Diniz, uma laranja… a moto ganhou prêmio.

Márcio: Essa mesmo.

LGC: Então vamos falar de customização, anos 2000, 2001 foi uma febre…


Márcio: Fiz muita coisa… tenho fotografia de todas essas máquinas daquela época… uma Nightrain verde que fiz para o Jean, tenho umas Springers


LGC: Nessa época começou a despontar uns caras, como o Caju e o Cris, que era a FF Motorcycles, Rafael… Um outro cara que teve moto, que vocês fizeram, que foi o Lulo da Casa dos Artistas, cujo pai era dono da Impala esmaltes

Márcio: Uma Deuce que tinha um tanque fosco com uma espécie de dragão

LGC: Outra coisa que eu estava comentando esses dias e que eu posso estar errado. Nos anos 2000 quando se começou a buscar restaurar moto antiga, ouvia-se falar que Flathead não era um motor legal…

Márcio: Quando se começou a fazer chopper no Brasil, os motores mais procurados eram o Panhead e Panshovel, por causa do filme, do Easyrider. A máquina procurada era a Panhead, mas quem não tinha uma, tinha uma outra chopper que era equipada com motor lateral. O motor lateral tinha uma rotação mais baixa que o Panhead. Mas, falar que o motor era ruim, isso não é verdade. Além disso, o motor mais forte que a Harley tinha pra puxar Side Car era o lateral 1200 cilindradas.

LGC: Ela fazia 750 e 1200 cilindradas?

Márcio: Todos os triciclos são 750 cilindradas. Se tem 1200 é porque colocaram o motor. Foi o único lateral que foi até 1974. E esse motor foi o motor mais usado, até os triciclos de polícia nos EUA era 750. Os 1200 acabaram em 1948. O 750, por causa do servcar ainda foi até 1974, só para esse tipo de uso, porque aguentava mais o tranco. Mas, é um motor que esquenta demais e tem aquela tocadinha. O Panshovel é de 1966 até 1969. Nós, brasileiros chamamos de Panshovel, pois nos EUA é Shovelhead. No catálogo você vai ver Shovel de 1966 até 1984. Aí, de 1985 pra cá, vem o Evolution.


ZC: Os Evo foram os primeiros motores que ganharam nome da fábrica, porque até então os motores tinham outros nomes e foram apelidados de Panhead, Shovel

Márcio: A fábrica chamava de FLH, tinha o motor L… já o Evolution ganha o nome. Vem escrito no motor. Por exemplo, o Knucklehead ganha o apelido porquê tem as porcas do cabeçote que lembram os ossos de um punho (knuckle em inglês).

LGC: que muita gente chama também de Chicago, por causa das motos da polícia de lá…

Márcio: É assim Gustavo. Hoje tem muita máquina valorizada a tal ponto de custar 200 mil, 250 mil… os caras põem uma lenda naquilo ali que gera tudo isso. Aquela máquina foi um baita boom porque em 1936 se fabricou uma máquina absurdamente diferente do que havia até então. Mas, por que parou de fabricar o Knuckle? Porque o Panhead é muito melhor, vazava menos óleo… e assim sucessivamente.

ZC: Assim chegamos no Millwakee 8…


Márcio: Pelo amor de Deus! Completamente diferente. Hoje todo mundo torce o nariz, mas é um produto diferente, mais equilibrado…


ZC: motor mais eficiente.


Márcio: é que agora entrou um novo CEO lá… a Harley chegou num ponto, que já passou da meia vida, com cento e poucos anos. Esse motor é excelente, mas a Harley tem que pegar esse motor e fechar num bloco só. Ela conseguiu fazer isso na V-ROD. O que aconteceu nessa moto? Era um filho bastardo, por assim dizer, um puta motor num quadro errado. O cara de Harley tradicional não aceitou aquela moto. A moto era maravilhosa. O que estragaram naquela moto? Meteram um pneu daquele tamanho.

LGC: Mas, não era a tendência daquele momento? Ela surgiu em 2003 e todo mundo estava metendo o rodão…

Márcio: a fábrica seguiu o que o público queria, só que estragou aquele quadro. Ela é uma moto boa de andar, mas com o pneuzão ela ficou esquisita. O que eu quero dizer é o seguinte: aquela mecânica é excelente, portanto, devia pegar e enfiar nas Tourings. O que está acontecendo com as Tourings hoje? Os clientes da Ultra estão migrando para a Goldwing (Honda).

LGC: Oh, Márcio, a gente gosta de Harley…


Márcio: Eu amo! Trabalho com isso! Eu não estou falando mal da Harley, mas se a Harley Davidson não mudar a cabeça, vai acabar. Pra resumir, o que eu quero dizer? A Ultra, por exemplo, nada mais é do que a mesma moto. Você entendeu, cara?


Ah, tá bom! Tem o motor M8 sensacional, mas está na hora de mudar aquilo ali, o motor foi feito em 1903 e tem motor, câmbio e primária separada. Quem está comendo pelas beiradas é a Indian. Ou seja, está na hora da Harley pegar esse motor, esmagar ele e fazer um bloco só.

Qual é o motor que mais dura da HD? Não existe outro. O Evolution. A Harley tinha que pegar a forma do Evo, fundir em ouro 18 quilates, encher de diamante, rubi e colocar na porta do Museu escrito assim: eu salvei a Harley Davidson. É o motor que mais dura. Quem fundia esses blocos era a Mercury Marine, subsidiária da Ford, e esses blocos são bons pra caramba, porque fundiam motor de popa, que era uma fundição perfeita. Daí começou a surgir motor bom.



Na mesma época a Honda lançou a Shadow American Classic. Na França fizeram um comparativo entre o motor Evo e o American Classic.

LGC: Voltando ao Flathead, você acha que o ressurgimento das antigas Flatheads hoje é porquê, durante um período, esses motores foram menosprezados e ficaram jogados por aí?


Márcio: O que está acontecendo agora? Acabaram os Panhead, os Knuckle e os Shovel, então o Flat é a bola da vez. Esse é um motor que está valorizando e aparecendo agora. O Panhead se imortalizou e ficou muito caro. Você não vai comprar uma moto por menos de 80 mil. Então, os caras estão começando a aparecer com os Flathead.


Vou contar uma coisa que pouca gente sabe. Quando surgiu a Honda CG 125 em 1976, laranja, quem era esperto, comprava uma «cegezinha» e chegava na casa de um cara que tinha uma Harley parada e oferecia a CG em troca. O dono da HD velha andava na CG (e ela andava), enquanto a HD estava parada e rolava a troca na hora. Acontecia assim também com outras motos, como a XL, a DT… nos anos 70 e 80 as Harleys não estavam valendo nada.


Voltando a falar da Shadow. A Honda fatalmente deve ter desmontado um motor Evo, e viu que era um motor simples, de um comando só. Aliás, hoje a HD voltou a ter um comando só. A Honda fez, por sua vez, um motor parecido, só que com um bloco só, com motor, câmbio e primária.

Não estou pedindo pra HD fazer um motor indestrutível, porque ela tem que vender motocicleta. A HD está brigando com uma parte da clientela que está morrendo e uma nova parcela que quer algo diferente, mas estão querendo uma moto que nunca quebra, só que assim a fábrica não vai vender motocicleta.

A Indian teve um boom porque o motor é bom. O que matou a Indian no Brasil foi o medo, porque as motos eram muito caras, o marketing foi horrível. Não tinha tanta moto para test drive. Só que agora os caras estão atrás das motos.

 

A Motobruk fica no italianíssimo bairro da Moóca em São Paulo e o atendimento deve ser agendado através dos seguintes números:

Motobruk - (011) 3044-3310

Marcinho - (011) 99531-0958

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