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Fordinho: uma paixão de pai para filho

Atualizado: 21 de set. de 2020

Texto: Luiz Gustavo Cabett e Zé Caetano

Fotos: Zé Caetano


Filho de colecionador, Carlos Eduardo Belluzzo Andrade, nos conta que se apaixonou pelos Fordinhos por sua simplicidade funcional. Ainda criança acompanhava seu pai nas investidas mecânicas e foi sendo seduzido por aquele universo de aficcionados únicos, o mundo dos Ford A.


Junto a amigos que nutrem a mesma paixão, crava uma incansável batalha para a perpetuação e adoração do exemplar. Divulgam o modelo, angariam «fiéis», debatem e trocam informações, colecionam literatura e memorabilia, verdadeiros arqueólogos e aventureiros, com seus passeios nesses veículos quase seculares.



Eduardo desenvolveu habilidades mecânicas que lhe permitem a manutenção de seus próprios exemplares e também oferecer serviços específicos a terceiros, de maneira exclusiva e individualizada, de acordo com as necessidades de cada caso.


Profundo conhecedor dos modelos disponibilizados pela montadora de Henry Ford, Eduardo relata que os Fordinhos eram configurados ao gosto do freguês, porém consegue-se identificar o DNA de cada veículo.


Luiz Gustavo Cabett: Estamos em frente a um Ford A Pick Up, que colocou o mundo sobre rodas, uma evolução do Ford T, que o Henry Ford dizia que o automóvel podia ser de qualquer cor desde que fosse preto.


Carlos Eduardo: O Ford A ganhou grande volume em 1929 quando o automóvel tornou-se um bem mais acessível. Antigamente o automóvel era para poucos. Henry Ford possibilitou que mais gente pudesse ter automóvel. Tornou-se um bem que mais pessoas tinham condições de ter e foi exatamente a simplicidade que tornou isso possível e o faz ser tão bacana hoje.


Henry Ford possibilitou que mais gente pudesse ter automóvel.

Gustavo: Estamos vendo um motor aberto aqui, o famoso Flathead... e você comentou que o que te seduz no Fordinho é justamente a simplicidade do motor. Não precisa de manual...

Eduardo: O que eu gosto dos Fordinhos, carros da década de 20 e 30 é que eles são muito lógicos, muito simples. Você com uma experiência básica de mecânica, conhecendo os conceitos básicos de mecânica você consegue entender um motor de um Ford A porque ele não traz surpresas e nem coisas escondidas. A gasolina desce do tanque de combustível por gravidade, passa pelo carburador e sobe por sucção para os cilindros... a faísca chega às velas através de lâminas e não por cabos... o ponto, você pode avançar e atrasar de dentro do carro... a mistura de ar e combustível você também regula de dentro do carro... é uma simplicidade interessante e gostosa de usar.


Gustavo: Uma curiosidade... é um carro trabalhoso de dirigir, não é?! Não é qualquer um que dirige...


Eduardo: Vamos dizer assim, você precisa ter ouvidos para dirigir. Como você que ajusta o ponto do carro, então, você determina a temperatura que ele vai funcionar, a potência que ele vai te entregar. Nos carros mais modernos, tudo isso acontece automaticamente. É um vácuo que avança e atrasa o motor. No Fordinho, não! Você precisa sentir que ele precisa ser atrasado ou adiantado, você precisa sentir que ele está esquentando e aí você avança um pouquinho mais para ele esfriar. São coisas que requererem sensibilidade, mas o conceito é muito simples.

No volante, as alavancas de regulagem do ponto e acelerador que garantiram ao modelo o apelido de Ford «Bigode»

Gustavo: Embora o nome Flathead venha pela tampa do motor, que seria a cabeça chata, isso aqui está no princípio do Flathead, que são as válvulas laterais, não é?


Eduardo: Esse motor não tem as válvulas sobre os cilindros, elas são laterais e acionadas debaixo pra cima, através do comando de válvulas que fica na parte inferior do motor. O outro motor, o motor já de comando de válvula superior...


Gustavo: Over Head Camshaft ou OHC


Eduardo: Exatamente! Esses têm um comando de válvula em cima, que é acionado através de corrente ou de correia dentada, acionando as válvulas de cima para baixo através de balanceiros.


Gustavo: Você comentou que veículos modernos usam a correia dentada.


Eduardo: A famosa correia dentada que quando arrebenta, atropela as válvulas e estraga tudo. Isso é coisa que o Fordinho não tem.


Gustavo: Uma coisa que é interessante de falar. E, sua paixão por Fordinho, surgiu como?


Eduardo: Meu pai gosta de carro antigo há muito tempo e eu cresci o vendo mexer, depois, fazendo coisinhas simples que ele me ensinava. Fui mostrando interesse, querendo aprender, pedindo pra fazer e incomodando, fui pegando gosto e aprendendo... E, assim, me apaixonei. Apesar de mexer com carros antigo em geral, a minha paixão realmente são os «pré-guerra», carros anteriores à década de 1940, que são os carros que têm essa mecânica mais simples, mais robusta. Aquilo que eu falei antes: você não é apenas um cara dirigindo, mas você é responsável pela boa dirigibilidade. Você que acerta o ponto de ignição, avançando ou atrasando, você que regula a mistura de ar e combustível, tudo isso através de comandos dentro do carro, enquanto dirige. Eu tenho uma participação no desempenho do carro. É isso o que eu acho bacana, é isso que eu gosto nos Fordinhos.

Gustavo: Uma coisa muito legal que existe nos Fordinhos é esse adorno em cima do radiador que te dá a temperatura de funcionamento do carro e você, por dentro, no volante, consegue ver a barra de mercúrio fazendo a aferição da temperatura.


Eduardo: Você tem um termômetro de mercúrio e ele mostra aqui a temperatura ideal de funcionamento do motor, até onde é tolerável que ela suba, a partir desse ponto algo deve ser feito. A hora que você percebe que ele começa a subir você tem vários recursos: alterar o ponto da ignição, enriquecer a mistura de combustível, que também interfere na temperatura do motor ou alivia a tocada.


Gustavo: De ano pra ano tem variação de colete, de barra do farol?


Eduardo: Sim, de 1929 pra 1930 aumenta a altura do colete e diminui o tamanho das rodas. O modelo 29 tem aro de 21 polegadas e o 1930 e 1931 tem aro de 19 polegadas, por exemplo.


Gustavo: Chega um determinado momento que o Fordinho passa a ter um motor de 8 cilindros...


Eduardo: Sim, em 1932 passou a ter a opção do motor V8 e os 4 cilindros em linha passaram a ser raros de se encontrar, porque todo mundo queria o motor V8 por sua maior potência. Na realidade, ainda no segundo semestre de 1931, a importação dos Ford com motor 4 cilindros, foi grandemente prejudicada pela divulgação da chegada do motor V8 com muito mais potência para o ano de 1932.


Gustavo: Todas as Pickups eram com capota de lona?


Eduardo: Não. Tanto a Pickup como os veículos de passeio eram oferecidos em versão de capota de lona e capota de aço. Para o Brasil, em virtude de ser um país quente, vieram muitos modelos com capota de lona e são bem raros os modelos de capota de chapa. Já nos EUA ocorre exatamente o contrário. A maioria tem capota de chapa e são muito raras as capotas de lona.


Gustavo: Uma coisa legal para mostrar é a variação dos coletes. Até 1929 são mais curtos e mais largos e, a partir de 30 ou 31, eles são mais altos e delgados...


Eduardo: De 1929 para 1930 ele ganha altura e de 1930 para 31 ele ganha o detalhe pintado na cor da carroceira na parte superior e inferior do colete. Uma outra particularidade interessante é que o aro de 21 polegadas dos 1929 tem a borda mais grossa, que chamamos de talão grosso e, no 30, ele diminui para 19 polegadas e termina em borda fina.